Novo CPC prevê processo extrajudicial de usucapião, porém com um requisito impraticável.
Uma antiga reivindicação dos cartórios
foi atendida com a edição do novo Código de Processo Civil (CPC): a instituição
do processo extrajudicial de usucapião. O texto, porém, não foi o esperado
pelos tabeliães. No processo, estabelecido para facilitar a regularização de
imóveis e desafogar o Judiciário, faz-se uma exigência que, de acordo com
especialistas, é muito difícil de ser cumprida. Solicita-se a assinatura do
proprietário que consta na matrícula.
De acordo com especialistas, os pedidos de usucapião
costumam ser feitos muitos anos depois da ocupação e raramente se conhece os
proprietários que constam nas matrículas. Em muitos casos, inclusive, já
morreram.
A possibilidade de regularização de imóveis por processo
extrajudicial está prevista no artigo 1.071 do novo CPC, que acrescenta o
artigo 216-A ao texto da Lei nº 6.015 - a Lei de Registros Públicos, de 1973. O
problema, segundo especialistas, está no parágrafo 2º.
O texto estabelece que deve constar na planta do imóvel
exigida pelo cartório a assinatura do proprietário. Caso não seja possível
cumprir a exigência, o registrador de imóveis poderá notificar pessoalmente ou
pelo correio o titular, que deverá se manifestar em 15 dias. Se não houver
resposta, ficará interpretado que está discordando do processo. O caso, então,
terá que ser levado à Justiça.
"Em vez de facilitar, vai dificultar", afirma
Rogério Bacellar, presidente da Associação dos Notários e Registradores do
Brasil (Anoreg). "Uma falta de resposta deveria ser interpretada como desinteresse
do proprietário, assim como ocorre na Justiça."
Em um processo judicial, o proprietário é citado. Caso não
se manifeste, um edital é publicado. Se ainda assim não se pronunciar no prazo
determinado, considera-se que concordou com a regularização do imóvel.
O presidente da Anoreg afirma que o tema já foi tratado em
um fórum que discutiu o novo CPC, em Brasília, e que o departamento jurídico da
entidade está elaborando um parecer para enviar à Corregedoria Nacional de
Justiça, órgão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). "Vamos pedir um
esclarecimento", diz Bacellar.
Na Justiça, um processo de usucapião pode levar mais de uma
década para ser resolvido. O trâmite é burocrático. Demora-se meses apenas
para juntar uma petição ao processo. Por meio extrajudicial, um caso poderia
ser solucionado em, no máximo, 120 dias.
A
demora gera impacto negativo no mercado. Há muitos casos em que
incorporadoras deixam de fechar negócios porque não querem assumir o risco. Se o processo passasse a ser de seis meses, como previam os cartórios,
com certeza o empreendedor assumiria o risco.
Um outro item da lei questionado por advogados é a
participação do tabelião no processo. Pela nova lei, o trabalho do perito
judicial - que em todo processo é nomeado por um juiz para ir até o local do
imóvel e colher depoimentos de testemunhas - será transferido para ele. Ou
seja, o requerente terá que ir até um tabelionato e fazer a solicitação de uma
ata notarial. O documento deverá ser entregue juntamente com a planta e o
memorial descritivo do imóvel no cartório de registro para que se possa dar
início ao processo.
Com as exigências, segundo advogados, casos de usucapião
continuarão a ser levados ao Judiciário. Segundo levantamento do Tribunal de
Justiça de São Paulo (TJ-SP), somente de janeiro a julho, cerca de 1,6 mil
novos processos foram distribuídos nas varas da capital paulista.
Titular do 26º Tabelionato de Notas de São Paulo, Paulo
Roberto Gaiger Ferreira, afirma que os treinamentos já estão sendo feitos e que
todos estarão prontos quando o novo CPC entrar em vigor. No tabelionato em que
atua, por exemplo, já há um espaço exclusivo para tratar dos casos. Ele diz,
inclusive, que já vem sendo procurado por advogados. "Um dos que nos
procuraram atua em um caso que está há nove anos na Justiça", diz.
Gaiger também vê a exigência da assinatura do proprietário
como um problema da lei. Mas acredita que, mesmo se não for modificada, poderá
colaborar para melhorar a situação atual. "O usucapião poderá ser
declarado pelo juiz com maior rapidez, já que o autor que tentou antes ir ao
cartório estará com todas as provas exigidas", afirma.
Fonte: Valor Econômico - Legislação & Tributos.
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